O Brasil ratificou o Estatuto de Roma em junho de 2002, abrindo caminho para o Tribunal Penal Internacional (TPI) exercer sua jurisdição sobre os crimes internacionais cometidos no país.

O Escritório do Procurador (OTP) do TPI afirmou que dará prioridade aos crimes sob sua jurisdição que sejam cometidos por meio de, ou que resultem em "destruição do meio ambiente, exploração ilegal de recursos naturais, ou desapropriação ilegal de terras" (ver o Documento de Política de 2016 da OTP sobre Seleção de Casos ).

Esta é uma visão muito breve da lei e análise dos "crimes contra a humanidade" ("CAH"), que é o crime internacional relevante para este caso. Para mais detalhes, por favor acesse a página DOWNLOAD ICC COMMUNICATION.

A LEI

Os Crimes Contra a Humanidade (CAH) estão previstos no Artigo 7 do Estatuto de Roma. Ela é composta de 1. elementos contextuais e 2. crimes/ações subjacentes.

1. Elementos contextuais

Os elementos contextuais são: Um ataque generalizado ou sistemático contra a população civil do Brasil de acordo com e/ou em promoção de uma política organizacional (por parte da Rede) para cometer tal ataque.

O "ataque" é um curso de conduta que envolve a comissão múltipla de crimes/ações subjacentes listados no Artigo 7(1). O ataque não pode ser meramente um conjunto de atos aleatórios, mas sim uma série de eventos (grandes em escala ou organizados de forma sistemática) cometidos de acordo com uma política.

A "política" requer a promoção ativa ou o incentivo de um ataque contra qualquer população civil, por um corpo organizado de pessoas, com um propósito particular. A política não precisa ser formalizada e pode ser inferida a partir de uma variedade de fatores considerados em conjunto, tais como um motivo, um padrão recorrente de violência, o uso de recursos públicos ou privados, ou declarações da organização que condescendam ou encorajem os crimes. Um perpetrador deve agir deliberadamente para promover a política ou engajar-se conscientemente na conduta visada pela política.

2. Crimes/Ações Subjacentes

Os três crimes subjacentes relevantes neste caso são homicídio, perseguição e outros atos desumanos. A perseguição "significa a privação intencional e grave dos direitos fundamentais contrários ao direito internacional em razão da identidade do grupo ou da coletividade". Os direitos fundamentais incluem o direito à vida; o direito de não ser submetido a tortura ou tratamento cruel, desumano ou degradante; e a liberdade de expressão, reunião e associação.

A ANÁLISE

Com base nas provas, existe uma base razoável para se acreditar que crimes contra a humanidade foram cometidos no Brasil. Um ataque generalizado e sistemático foi cometido contra uma população civil, compreendendo assassinato, perseguição e outros atos desumanos. A perseguição baseia-se em motivos políticos e/ou culturais.

Os dados da CPT (2011-2021) mostram:

a. Violência contra pessoas: 430 assassinatos; 554 tentativas de assassinatos; 2290 ameaças de morte; 87 casos de tortura; 1559 prisões (muitas delas ilegais); 2072 agressões; e 259 mortes decorrentes;

b. Violência contra a ocupação e posse de terra: 14.889 expulsões; 96.028 despejos; destruição de 31.463 casas; destruição de 33.185 jardins/lotes de cultivo; destruição de 44.730 outros bens; e 163.956 ameaças relacionadas a armas de fogo.

Este ataque foi cometido pela Rede durante a última década, contra milhares de usuários de terras rurais e seus defensores, de acordo com uma política organizacional voltada à promoção da desapropriação de terras, a exploração de recursos naturais e a destruição do meio ambiente, independentemente da lei.

A Rede é composta por atores públicos e privados de vários níveis da sociedade brasileira, e inclui políticos, funcionários públicos, policiais, representantes de interesses comerciais privados e uma galeria de atores criminosos.

Esta política promoveu e/ou encorajou a comissão dos crimes subjacentes, os quais foram perpetrados por atores dos setores público e privado, nos níveis local, estadual e federal. O curso da conduta equivale a um fluxo constante e consistente de eventos criminosos ao longo da última década, em prol da política da Rede.

Como a maioria dos crimes está ligada à desapropriação ilegal de terras, à exploração ilegal dos recursos naturais e à destruição do meio ambiente, o OTP deveria dar prioridade a este caso.